Por: Ir. Lucas de Brito, L.C.

Quando imaginamos a um rei normalmente pensamos em um homem majestoso, vestido de púrpura, cetro na mão e uma coroa com brocados de ouro na cabeça. De fato, Mark Twain representa assim a figura ideal de uma personalidade da realeza no seu livro “O Príncipe e o Mendigo”. A obra narra a história de um príncipe com o grande sonho de brincar algum dia com os meninos da rua. Até que um dia encontrou-se com um mendigo, trocou as roupas com ele e viu realizado o seu sonho por um instante.

O Filho de Deus também tinha um sonho parecido ao deste príncipe. Sendo legítimo herdeiro do Pai e gozando de todos os benefícios do céu quis despojar-se de sua púrpura para vestir aquela pobre roupa humana. E como o fez? Encontrou-se com uma Virgem, por meio dela recebeu a humanidade e, em certo modo, também nos vestiu da sua divindade.

Já em sua vida madura, Jesus era muito consciente do seu reinado e o afirmava constantemente. Mas parece ser que os soldados romanos não tomaram em sério essas afirmações de Jesus. “Teceram uma coroa de espinhos e a colocaram na cabeça de Jesus” (Mt, 27,29). A coroa foi feita em formato de capacete e não de coroa como se representa comumente nas representações artísticas. Provavelmente foi confeccionada das plantas Gundelia tournefortii, Rhamnus lycicoides e Ziziphus spina-christi, providas de espinhos longos e pontiagudos, muito típicas na Palestina.1 Num estudo recente encontrou-se no Santo Sudário grãos de pólen provenientes destas plantas e datados do século I d.C.2

O capacete de espinhos deve haver causado uma enorme dor e um sangramento abundante, devido à quantidade de circulação sanguínea e terminações nervosas nessa área. De acordo a uma análise do Sudário realizada pelo Dr. Giovani Judica Cordiglia, as feridas causadas pela coroa de espinhos são aproximadamente cinquenta e estão espalhadas por todo o couro cabeludo. É difícil calcular todo o sofrimento que isso causou a Jesus.

É este o rei tão citado no Antigo Testamento? Não era ele o rei da glória? Que glória tem ele com sua coroa de espinhos? É este o rei que quero seguir? Como é difícil responder a estas perguntas! Nem mesmo aqueles discípulos Tiago e João desejosos de sentar-se à direita e à esquerda do rei puderam estar com ele neste momento. Quem pode seguir a um rei humilhado e aparentemente perdedor?

Este é o momento crucial para o Reinado de Jesus. É nessa hora difícil quando aparece o rei deste mundo, de “aspecto agradável”, sorridente, bonzinho, menos radical, mais “light”. Sinceramente, à primeira vista o primeiro rei parece ser muito mais promissor que o anterior. Com este, as minhas necessidades imediatas são saciadas, enquanto o outro me fala de uma tal esperança. Quem quer esperar quando se pode ter agora? Não resta dúvida que atualmente o segundo é mais atrativo.

Mas paremos então para analisar o verdadeiro “patrimônio” de cada um destes reis. Quando um pai possui uma casa, o filho nunca poderá sentir-se plenamente dono dela, ainda que usufrua e participe da propriedade do pai. A casa somente chegará a ser totalmente do filho por meio da herança, podendo finalmente fazer aquilo que queira com ela. Da mesma maneira receberemos a nossa fortuna e gozaremos eternamente dela de acordo com o rei escolhido por nós.

O monarca deste mundo pode oferecer muitas coisas aqui, já e agora, mas tem muito pouco a oferecer na outra vida. Embora prometa riqueza, fama e prazer imediato, ao final muitos se sentem vazios, a pesar de possuírem aparentemente tudo. E aqueles que o seguem, além de viverem toda uma vida cheia de desolações e felicidades aparentes, terminam no fogo eterno. Que herança desprezível!

Enquanto Jesus, o Rei da Glória, nos oferece uma proposta diversa. Não nos promete uma felicidade imediata, mas uma duradoura. Nesta vida seremos participadores dos seus sofrimentos, como um filho participa daquilo que se apropria o Pai, mas quem carregará o peso completo será Ele. Também nos promete uma herança magnífica: a Felicidade Eterna. Que herança maravilhosa receberemos ao chegar ao céu e escutar: “vinde, benditos de meu Pai!”(Cf. Mt 25, 34). A que rei escolheremos?

No meio do caminho Quaresmal este pode chegar a parecer longo e pesado. Há momentos em que o sacrifício pode parecer impossível, sendo eu incapaz de levá-lo adiante. Não seria melhor o outro rei? A Quaresma deve ser vivida não com meus sofrimentos, mas com os sofrimentos de Cristo. Pois quando me centro somente nas minhas próprias feridas, nunca poderei ver aquelas verdadeiras feridas que são fonte de minha Salvação. Não devemos tirar nunca os olhos da meta, pois no final do túnel reluz o prêmio celeste ao qual eu persigo. (Cf. Fl, 3, 14).

Aproveitemos essa Quaresma para escolher ao verdadeiro Rei de nossa vida para ressuscitar com Ele na Páscoa. Ele é o Tesouro e o sacrifício é somente um meio para chegar a Ele. Que em cada dia deste período de conversão a expressão “venha a nós o Vosso Reino” adquira um novo e profundo sentido na nossa vida: o de um coração cada vez mais propriedade de Cristo

Senhor Jesus, obrigado pelo Vosso imenso amor. Com quanto desejo de instaurar o seu Reino em meu coração, sofrestes a dor de uma coroa de espinhos, para que eu pudesse colocar em minha cabeça a coroa do Teu Reino. Ajudai-me, pela contemplação do Vosso Santo Sudário, a perceber o quanto sou amado por Vós, para que assim eu possa ser cada vez mais Vosso.

Referências:

1 Car. A. Cañizares, H. Guerra e J.P. Ledesma, Cristo Nossa Páscoa. Lucerna.

2 Ibid.

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