“Então os seus olhos abriram-se; e, vendo que estavam nus, tomaram folhas de figueira, ligaram-nas e fizeram cinturas para si. (…) O Senhor Deus fez para Adão e sua mulher umas vestes de peles, e os vestiu.” (Gn 3,7.21)A roupa tem uma função: a partir do pecado original, os corpos dos homens – homem e mulher – passam a ser atingidos pela morte e pela doença. É preciso proteger-se das intempéries: defender do frio, conservar o calor, impedir que a chuva nos molhe, auxiliar na defesa contra animais. A primeira função da roupa é, pois, proteger o corpo, e isso é uma necessidade advinda da nova condição do ser humano após a Queda.Mas como o corpo e a alma são unidos na mesma pessoa e juntos são constitutivos da mesma natureza humana, há uma certa ligação entre corpo e alma. A roupa protege o corpo, mas também protege a alma. Ao corpo, serve a roupa para proteger dos problemas físicos. À alma para proteger dos problemas espirituais. Se no corpo a vestimenta conserva a temperatura, na alma ela conserva a pureza. Em outras palavras, assim como Adão e Eva perceberam, após o pecado, que estavam nus e viram maldade nisso, também continuamos a ter essa tendência da malícia, um forte componente da falta de castidade e da impureza: e assim como eles providenciaram roupas primitivas e Deus, depois, criou vestes ainda mais adequadas, nós protegemos nossas almas dos dardos malignos do demônio, do mundo e da carne, que querem tirar nossa pureza. A roupa precisa ser adequada para defender o corpo das altas ou baixas temperaturas e de todas as agressões externas. Da mesma forma, precisa ser adequada para, protegendo o corpo e cobrindo o que deve ser coberto, proteger a alma de todas as agressões espirituais. Em suma, a roupa, como querida por Deus desde o pecado de Adão e Eva, precisa ser modesta.
A mudança do estado de natureza íntegra, no qual foram Adão e Eva criados, para o estado de natureza decaída, após o pecado original, muda toda a história da humanidade, estabelece a malícia, e a necessidade de também estabelecer remédios contra o mal inaugurado no mundo. O remédio é a graça santificante, bem o sabemos, e que virá pelo sacrifício de Cristo na Cruz, mas essa graça age, se bem que principalmente pelos sacramentos, também de meios naturais pelos quais se serve. A roupa feita por Deus é um deles – e mostra a todos nós que, para que enfrentemos corajosamente nossas más tendências, presentes na alma desde o pecado de nossos primeiros pais, temos que prestar atenção nas nossas vestimentas, para que sejam adequadas, como aquelas que o Criador teceu para o homem e a mulher depois da Queda.Outras funções tem a vestimenta, como social, necessidade de trabalho, adaptar-se à cultura etc, e isso vamos ver, se preciso, ao longo da obra. Agora o que nos interessa é isso: a roupa defende o corpo e a alma. E expressa, por isso, o que significa o homem, o que significa a mulher. “A roupa, além de responder à necessidade natural de cobrir o corpo, é também uma manifestação da cultura de um povo. Mediante a moda, podemos adivinhar a sensibilidade de uma época e sua visão do homem.” (Persona y moda, el sentido de la elegancia. Conferencia pronunciada en el Corte Inglés, León, 11 de noviembre 2009.Avancemos. Deus, além de providenciar vestes e proferir maldições a Satanás, bem como dar um castigo ao gênero humano, promete um Salvador e séculos mais tarde envia Jesus Cristo, Seu Filho para morrer na Cruz por nós, dando-nos a Redenção. Essa Redenção é completa e atinge o ser humano em sua integralidade, promovendo uma renovação de nossas relações, uma purificação de nossa vida, inclusive de nossas relações uns com os outros, com o sexo oposto, e da forma como enxergamos o corpo e a virtude da pureza. A Redenção é um fato que nos muda por completo, e nos faz passar para uma nova cultura sob a graça, que nos faz ser puros por Sua ação e nossa colaboração com ela. “… O Papa defende vigorosamente o real poder de redenção para libertar o coração humano do domínio da luxúria, chamando homens e mulheres para um novo ethos.” (Christopher West).
O interior se manifesta no exterior, não esqueçamos.
Jesus mesmo no diz: “O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração, e o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, porque a boca fala daquilo de que o coração está cheio.” (Lc 6,45) O exterior, pois, deve ser reflexo do interior, e não nos adianta nada cultivar apenas o interior, desdenhando do exterior. O homem é alma unida a um corpo. Claro que a alma é mais importante, claro que esta é a forma, claro que ela é que nos garante a semelhança com Deus, e dela procedem os afetos e as intelecções. Não olvidemos, todavia, que embora menos importante, o corpo é também criação de Deus. Negar isso é cair na gnose, é achar que o corpo é maldito, é ruim. O corpo precisa submeter-se à alma, mas não ser negado ou extinto. Até mesmo o Credo que rezamos em todas as Missas diz que no fim do mundo haverá a ressurreição da carne: não é só a alma que será salva, o corpo também. O homem ressuscitado unirá sua alma salva ao corpo tornado glorioso. A busca da santidade, questão profundamente interior, deve se manifestar no exterior, também em nossas vestes, que passam sempre uma mensagem aos outros.“Você pode ter o que quiser se você se veste para isso.” (Edith Head)
A moda “periguete” ou “biscate”, por exemplo, é reflexo de uma crise gravíssima na identidade feminina, um fruto do feminismo, que tanto combateu pelos direitos da mulher e que gerou, paradoxal mas necessariamente, a vulgarização da mulher por conta de um mal compreendido exercício desses mesmos direitos. Também é manifestação da imagem que a mulher tem de si mesmo, como se o atraente fosse a exposição desmedida de seu corpo. Como li em algum lugar, para algumas não basta ser graciosamente sexy, pois o objetivo é parecer modelo de capa de revista de gosto duvidoso ou madrinha de bateria em ensaio de escola de samba.
O grande São Paulo da Cruz, em carta de 9 de março de 1760, adverte à sua dirigida Teresa Palozzi para que “guarde todos os seus sentidos, em especial os olhos, e também seu coração. Seja modestíssima e guarde a maior compostura de noite e de dia em todos os seus gestos. Deves amar e guardar a virtude da modéstia com o máximo zelo; não se fie em nada e, sobretudo, desconfie de si mesma.”
Se o seu coração feminino exala a sua fé cristã, você transparecerá isso em tudo, inclusive em seu vestuário. E isso a ajudará até mesmo a conseguir um relacionamento conjugal sólido e sadio. “O coração de uma mulher deve ser tão próximo de Deus que um homem precisa persegui-Lo para encontrá-la.” (C.S. Lewis)