(Mc 9,2-10)
(II domingo de quaresma)
Este domingo se apresenta como o domingo das revelações. As coisas mais profundas não são ditas em qualquer hora, mas em momentos importantes. Ninguém abre o coração a qualquer um. Isso me lembra um filme que gosto pelos valores que transmite: O Presente (The Ultimate Gift). O avô bilionário falece e deixa algo para seu neto arrogante. Nem passava pela sua cabeça que seu avô queria deixar-lhe algo. E deixou algo muito mais que alguns milhões de dólares. Trilha para ele um caminho para adquirir a responsabilidade e o amor através de doze tarefas, que na realidade são doze presentes para ele. O valor do trabalho, do dinheiro, dos amigos, do conhecimento, dos problemas, da família, das risadas, dos sonhos, da doação, da gratidão, do dia, do amor.
A liturgia de hoje também nos revela muitos tesouros: Jesus revela aos seus discípulos qual é seu verdadeiro rosto, o Pai revela quem é o Filho, o Filho revela o rosto do Pai. Depois de vários anos com Jesus, depois de tê-lo visto agir e realizar muitos milagres, os apóstolos não duvidavam que Jesus era alguém especial, o enviado do Pai. Apesar da sinceridade da amizade que tinham com Jesus, será que eles suportariam vê-lo morrer crucificado? Jesus toma três dos seus apóstolos para contar-lhes um segredo. Leva-os ao monte, o lugar da oração, do encontro com o Pai e lá mostra seu verdadeiro rosto. Jesus se transfigura diante deles e, como se fosse pouco, chama as grandes personalidades do Antigo Testamento como testemunhas: Moisés e Elias. Parecia estar num sonho. “Senhor, façamos três tendas para vocês; não queremos sair daqui!” Os apóstolos sabiam que Jesus era alguém muito especial; neste dia, têm a certeza de quem Ele é verdadeiramente: “Este é o meu Filho muito amado, escutai o que Ele diz!” Aquilo que Pedro exclamou a pouco tempo ao professar sua fé em Cristo – “tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo (Mt 16,16) – é confirmado pela voz do mesmo Pai: este é o meu Filho muito amado.”
Deus Pai revela seu Filho, Jesus. “Ninguém sabe quem é o Filho, a não ser o Pai; e ninguém sabe quem é o Pai, a não ser o Filho e aqueles a quem o Filho o quiser revelar (Lc 10,22). Ninguém vem a mim se o Pai não o atrair” (Jo 6,44). Quantas vezes queremos conhecer mais a Jesus, mas não sabemos como rezar. Talvez, tenhamos esquecido que a oração é um dom. Conhecer a Jesus, conhecer a Deus não é fruto dos nossos esforços; nós colaboramos com Deus, mas sobretudo é um dom de Deus. O que Deus Pai nos diz de Jesus? “Este é o meu Filho amado (Mc 9,7) no qual ponho todo meu agrado” (Mt 17,5). Jesus é o Filho enviado do Pai, seu mediador com os homens (cf. I Tim 2,4), seu verdadeiro representante. É por isso que devemos escutá-lo. Jesus é também o “Filho amado do Pai”. “Se vocês, apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos seus filhos, quanto mais o Pai de vocês, que está nos céus, dará coisas boas aos que lhe pedirem!” (Mt 7,11). Como será o amor de Deus Pai por seu único filho? Todas as coisas me foram entregues por meu Pai (Lc 10,22). Tudo aquilo que o Pai tem, tudo aquilo que o Pai é, Ele entregou ao seu Filho, Jesus Cristo.
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Neste grande amor que o Pai tem por seu Filho, Jesus nos revela algo a mais, algo toca a nossa pele de modo mais direto. Jesus revela o rosto do seu Pai. Ele não é um deus qualquer. Sim é todo-poderoso, mas aquilo que lhe caracteriza não é o seu poder, mas seu amor. Por amor dá tudo o que tem ao Filho; por amor dá tudo o que tem, seu Filho, para nos salvar; o que não permitiu Abraão fazer, Ele o faz: “não poupou a seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós” (Rom 8,32).
Qual é a imagem que nós temos de Deus? Um ser potente, alguém muito grande, o senhor de tudo, mas talvez alguém distante que nem se preocupa pela minha vida pessoal. Jesus vem nos dizer quem é seu Pai: aquele que não poupou a seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós (Rom 8,32). Ao vermos Cristo crucificado podemos entender melhor esse amor de Deus Pai. Falávamos que a raiz de todo pecado era a desconfiança do amor que Deus nos tem e que Jesus veio arrancar esse mal pela raiz. Parafraseando o primeiro capítulo do livro das Lamentações, contemplando o rosto de Cristo crucificado podemos ver o rosto do seu Pai: “olhai e vede se há algum amor como o meu (cf. Lam 1). Que mais se poderia fazer, que eu não tenha feito?” (Is 5,4).
Jesus nos revela o Pai; Ele é a Palavra do Pai. Tudo o que tinha que ter dito, o Pai pronunciou por seu Filho. “Se Deus é por nós, quem será contra nós? Não nos dará juntamente com ele, e de graça, todas as coisas?” (Rom 8,31-32). Quem nos separará do amor do Pai revelado em Cristo? Nesta quaresma, Deus nos chama a voltar ao essencial. Marta, Marta! Tu te preocupas e te inquietas com muitas coisas; todavia apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada” (Lc 10,41-42). E o essencial é o amor que Deus nos tem, este amor que é mais forte que a morte, pois vence a mesma morte, este amor que é gratuito, pois nos amou quando ainda éramos pecadores (Rom 5,8). Aproveitemos este tempo de quaresma para contemplar o rosto do Pai em Cristo crucificado através da oração da Via-Sacra pedindo que o amor de Deus toque nosso coração.
Para mais homilias de Pe. Mairon Gavlik, L.C., veja sua coluna especial em nosso blog!