Por: Ir. Lucas de Brito, L.C.
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E se fosse eu? Poderia aguentar o peso de uma cruz ignominiosa? Que escândalo provoca a cruz! Com esse motivo eclodem polêmicas discussões sobre a retirada de crucifixos de ambientes públicos. Quem pode suportar uma agonia assim? Como não se escandalizar diante de tão terrível instrumento de tortura? Se só me trazes a morte, nós não te queremos, maldita cruz!
Entretanto, a Igreja Católica nos fala constantemente da cruz. Uma antiga tradição da Igreja remonta a Cruz de Cristo a uma comparação com a árvore do jardim do Éden. Esta última foi criada para dar a vida, enquanto que a “Árvore de Cruz”, criada para dar a morte, se transforma em Árvore da Vida, fecundada pelo Sangue do Redentor. Mas como um instrumento de tormento pode se tornar em vida fecunda?[1]
Nos encontramos diante do momento mais paradoxal da história do nosso cristianismo: uma morte que dá vida e uma vivência de mortificações. “Qualquer outra pessoa veio a este mundo para viver, enquanto (Cristo) veio para morrer”[2]
Depois de uma longa caminhada, Jesus chega ao Gólgota carregando o seu patíbulo, pronto para ser crucificado. A técnica de crucifixão consistia em deitar o réu de barriga para cima, fazendo coincidir o dorso das mãos com os extremos do madeiro. As costas recostavam na terra do Calvário. Uma equipe de cinco soldados especializados na prática de crucificar, ajudavam a sustentar os braços e martelar os cravos. Estes pregos eram próprios para construção e chegavam a medir 14 centímetros de longitude e 1 centímetro de diâmetro.
Por muito tempo se pensava que os cravos haviam transpassado as mãos de Jesus, mas o Santo Sudário nos revela um abundante sangramento na região dos pulsos. Um dos maiores estudiosos do tecido, o Dr. Pierre Barbet, demonstrou com um experimento a impossibilidade das mãos de resistir o peso do corpo com os cravos.[3] Provavelmente os pregos penetraram na região radial do carpo(pulso), danificando o nervo médio. Essa conexão nervosa é responsável pela oposição do polegar e a sua ruptura deve haver causado uma dor terrível. De fato, não se podem observar os polegares do homem do Sudário.[4]
Para erguer a Cristo, três soldados levantavam o madeiro horizontal. Um outro soldado, montado em uma escada apoiada na haste vertical, espera para encaixar o patíbulo. Uma vez encaixado, é hora de cravar aos pés. Segundo a imagem de Turim, os pés foram fixados diretamente na cruz com um único cravo, sem o auxílio de um supedâneo. Sobre o pé direito de colocou o esquerdo, girando o direito suavemente para fazer coincidir o ponto de entrada do prego.[5]
Nos braços do homem do Sudário se observam fluências de sangue que mais parecem desafiar as leis da gravidade. Sem embargo, isso se deve à posição em que esteve Jesus quando crucificado. É bastante difícil respirar na posição de cruz. Para a expiração, Cristo tinha necessidade de relaxar as pernas, e concentrar todo o seu peso nas mãos, com uma inclinação da cabeça. Já para a inspiração, Cristo devia erguer o peito, encostar a cabeça na cruz e flexionar um de seus braços quase em 90º. Esses movimentos provocavam o desgarre da pele e uma maior lesão dos nervos afetados, provocando uma intensa dor.[6]
É impressionante pensar que Jesus ainda esteja vivo, e mais ainda, que seja capaz de pronunciar as suas últimas sete palavras, apesar da grande dificuldade para respirar. Enquanto os crucificados normalmente professavam maldições e injúrias, da boca deste Homem somente saíram palavras de doação de si mesmo. Isso nos mostra não ser a dor de uma cruz a causa de nossa redenção. De nenhuma maneira a nossa Salvação foi comprada pelo sofrimento de Cristo, foi o seu amor quem a comprou. “Somente o amor dá um sentido e uma direção à dor”[7]. Neste momento Jesus estende os seus braços em um movimento de abraço à toda a humanidade e restaura o homem do abandono no pecado, reestabelecendo a sua relação com Deus Pai.[8]
Por esse motivo não te queremos, maldita cruz carregada sem amor! Porque tu sem amor és vazio, nada, maldição e suplício. Não tens sentido por ti mesma. É Cristo, fundamento do amor mais radical, que se entrega até consumir-se inteiramente para elevar ao homem e salvá-lo.”[9] Pois é somente “a partir daquele olhar [de amor, que] o cristão encontra o caminho do seu viver e amar.”[10]
Pela imagem de Cristo crucificado, nós católicos devemos olhar além daquilo que aparece como cruz. Pois um cristão não é chamado a sofrer, mas a amar com todas as implicações do amor. Afinal, a cruz sem amor, ou seja, sem Jesus, termina em pelagianismo ou masoquismo. Seremos cada vez mais verdadeiros cristãos na medida em que nos crucifiquemos com Cristo.
Senhor Jesus, livrai-me de viver a cruz sem a Vossa presença. Eu não posso carregar uma cruz somente minha, por isso permiti-me um lugar no lado vazio do madeiro em que Vós estais pendente. Ajudai-me a crescer em minha vida cristã na consciência de que só posso ser plenamente santo na medida em que esteja junto contigo na cruz. E acima de tudo, ensinai-me a amar com o Vosso amor.
Referências:
[1] Car. A. Cañizares, H. Guerra e J.P. Ledesma, Cristo Nossa Páscua. Lucerna.
[2] Fulton Sheen, Vida de Cristo.
[3] Barbet, M.D., Pierre, A Doctor at Calvary: The Passion of Our Lord Jesus Christ As Described by a Surgeon
[4] De Palácios y Carvajal, José, La Sábana Santa: estudio de un cirujano.
[5] Ibid.
[6] Ibid.
[7] Ratzinger, J., Introduzione al Cristianesimo, 293 – (tradução minha)
[8] Ibid.
[9] Ibid.
[10] Bento XIV PP., Deus Caritas Est. n.12